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Este ingrediente da cerveja tem se tornado um “atestado de qualidade”, temos ouvido falar mais dele nos últimos anos. As gigantes do mercado cervejeiro vêm investindo bastante lançando cervejas puro malte, e até mudando suas campanhas de marketing… mirando mais em demonstrar “qualidade” do produto e não coisas externas aos produtos (leia-se: bundas e mulheres pouco vestidas). Isto, é claro, “motivado”, ou pressionado pelo crescimento do mercado artesanal, onde os clientes exigem mais qualidade dentro do copo. Mas e aí? O que de fato é o malte?
Malte é um cereal que passou por um processo de germinação e secagem. Basicamente qualquer grão pode passar pelo processo de malteação, cevada, trigo, centeio, arroz, milho. Por definição, cerveja é o produto da fermentação alcoólica de malte de cevada (podendo ter outros adjuntos) e lúpulo. Logo, cevada é o grão mais utilizado pelas maltarias, e é sobre o malte de cevada, especificamente, que falaremos.
Durante o processo nas maltarias, os grãos passam por diferentes etapas com umidade e temperaturas controladas. Em um primeiro momento o grão absorve água, que estimula a síntese e ativação de enzimas, que vão quebrar as paredes celulares do endosperma, feitas de carboidratos e proteínas. Isto é importante para expor o amido armazenado no interior do grão, ficando disponível para o embrião se alimentar e crescer. Na germinação o embrião cresce e provoca o desenvolvimento de outras enzimas, principalmente amilases, que serão muito úteis no processo cervejeiro.
Neste momento o grão está com o amido já disponível, com as enzimas que serão úteis para a produção cervejeira também em grande quantidade e é a hora de interromper o processo, caso contrário não teremos malte, e sim uma planta. O processo é interrompido através da secagem dos grãos e é a partir deste momento que começam a surgir diferentes tipos de malte de cevada.
Maltes “base” são os malte de cevada que foram secos e não passaram por tratamentos em temperaturas elevadas, mantendo assim o amido e as enzimas, pode-se dizer, totalmente disponíveis para o processo cervejeiro.
Os maltes especiais podem passar por torra, cozimento (reação de Mailard), defumação, o que vai conferir aromas específicos, cores mais escuras, e necessariamente vai prejudicar o poder diastático do grão, ou seja, a quantidade de enzimas ao passar por este processo diminui consideravelmente. Em alguns casos, até mesmo o amido já não estará mais disponível para ser convertido em açúcares fermentescíveis. Vai caber ao cervejeiro conhecer cada grão e achar as proporções adequadas de maltes base e maltes especiais para cada receita.
Curiosidade: Algum tempo atrás, sobretudo antes da revolução industrial, não se tinha condições de controlar perfeitamente a umidade e a temperatura dos processos. Basicamente todos os grãos tinham aroma de fumaça (da secagem) e cores escuras, consequentemente, as cervejas também, além de serem mais adocicadas.
Para a cerveja ser puro malte, é necessário que ela contenha apenas malte de cevada como fonte de açúcares para a fermentação. Isto não é garantia, no entanto, de que cerveja puro malte é melhor que as demais. Considerando apenas os ingredientes e não os processos, o que ajuda a definir se vai ser melhor, ou não, é o motivo pela qual os outros ingredientes foram adicionados. Nas grandes indústrias, por exemplo, milho, arroz e outros açucares menos nobres são largamente utilizados para diminuir custos, o que é a raiz desta teoria de que só as “puro malte” são boas. Já a utilização de trigo, centeio, aveia e frutas, por exemplo, definitivamente não tem esta mesma razão financeira. Na verdade, até a utilização de açúcar de cana pode não ter a intenção final de baixar custo. A teoria de que as “puro malte” são melhores só faz algum sentido quando aplicada às cervejas das gigantes predadoras do mercado cervejeiro.